Foram cerca de 45 anos sem enxergar, sendo privado de contemplar as belezas naturais do mundo, impedido de apreciar a face das pessoas amadas e suas expressões. Uma vida no escuro, no completo breu. Se fosse nos dias atuais, certamente a cegueira de nascença não seria um empecilho para se ter uma vida normal. Mas e se essa história fosse há pouco mais de dois mil anos?!
Para os hebreus pessoas coxas, cegas, corcundas ou com alguma outra condição eram consideradas indignas, tocadas pelo maligno e/ ou portadoras de pecados “graves” – cometido por eles ou por suas famílias. E é nesse contexto que João narra o sexto milagre de Jesus, a cura do cego de nascença. Em seu evangelho João registra sete milagres apenas, e são chamados de sinais, pois apontam para a pessoa de Jesus. Até o capítulo nove Jesus havia transformado a água em vinho, curado o filho de um oficial do rei, curado o paralítico, multiplicado os pães e peixes, e havia andado sobre as águas. Conforme o Pr. Augustus Nicodemus falou “Ele tem poder sobre o mundo natural, Ele não está sujeito as leis naturais, mas usa estas leis de acordo com sua vontade e seu querer”.
A luz do mundo
Jesus estava em Jerusalém, para a festa dos Tabernáculos. E no capítulo oito Ele declara sobre si mesmo: “Eu sou a luz do mundo. Quem me segue não andará nas trevas; pelo contrário, terá a luz da vida” (v. 12). Essa afirmação e outras atitudes de Cristo (como não condenar a mulher adúltera) haviam enfurecido os mestres da lei, que acusavam Jesus de blasfemar contra o próprio Deus. Ainda durante a festa, no sábado, o principal dia da festa e provavelmente o mais tumultuado, Ele se depara com o cego de nascença. Este era conhecido por todos na cidade, os discípulos então questionam Jesus sobre quem deveria ter pecado para que aquele homem fosse cego: ele ou os pais? Ao que Cristo responde com uma terceira opção: ninguém! “Mas isso aconteceu para que nele se manifestem as obras de Deus” (verso 3).
Jesus tinha em mente que a cura daquele homem exemplificaria exatamente o que Ele vinha falando anteriormente, sobre ser a luz do mundo. É nesse ponto que os 45 anos de uma vida em treva se transformam na gloriosa luz de Cristo. Esse é o momento em que podemos entender que “coisas ruins” acontecem para que a obra e a glória de Deus seja manifestada para os homens. Sim, eu estou dizendo que Deus permitiu que esse homem nascesse cego e vivesse boa parte de sua vida como um pedinte nas ruas de Jerusalém. Foi assim que ele ficou conhecido por todos, e é assim que o testemunho sobre Cristo se torna ainda mais fidedigno.
Contra fatos não há argumentos
“Enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo. Depois de dizer isso, Jesus cuspiu na terra, fez lama com a saliva e com a lama untou os olhos do cego.” (capítulo 8, versos 5 e 6 – grifo do autor). Como vimos anteriormente, Jesus não se limita as leis naturais, ou seja, Ele pode curar simplesmente com as palavras, Ele não precisa tocar,”fazer um remédio”, ou nesse caso fazer barro, lama. Ainda assim Ele escolhe cuspir na terra e passar a mistura nos olhos do cego e pede que ele vá se lavar no tanque de Siloé, do qual as pessoas tiravam a água para a festa que estava acontecendo, isso quer dizer que aquele local deveria estar cheio de gente. Ao lavar seus olhos e perceber que conseguia enxergar as pessoas ao redor começaram a comentar, afinal elas o conheciam e sabiam de sua cegueira.
Ao ser questionado sobre o ocorrido aquele homem disse: “o homem chamado Jesus fez lama, passou nos meus olhos e disse: ‘Vá ao tanque de Siloé e lave-se.’ Então fui, lavei-me e estou vendo.” (v.11 – grifo do autor). Ele foi levado aos fariseus, afinal era sábado e não era permitido trabalhar (ou ser curado). Lá ele foi questionado novamente sobre sua cura, e quando quiseram saber quem a havia feito ele respondeu “um profeta” (v.17 – grifo do autor). Os fariseus não queriam dar o crédito desse milagre a Deus, pois eles não aceitavam que um homem de Deus teria feito algo ao sábado. O maior problema aqui é que eles se apegaram as leis e doutrinas criadas por eles mesmos, a ponto de ficarem cegos para o que realmente estava acontecendo.
Na lei dos judeus tem 37 categorias de coisas que não poderiam ser feitas ao sábado, uma delas é fazer barro! E se Jesus havia feito isso, quebrado a lei, os fariseus deduziram que Ele não era de Deus, ao longo dessa conversa o homem deixa claro que não estava ali para discutir doutrinas, e sim para testemunhar “se é pecador, não sei. Uma coisa sei: eu era cego e agora vejo.”(v.25). Um apouco mais adiante declara: “se este homem não fosse de Deus, não poderia ter feito nada.” (v.33 – grifo do autor). Sem ter argumentos para refutar o (ex) cego, os fariseus o expulsaram.
Cegueira da alma
Jesus vai ao encontro do homem e se revela a Ele como Filho do Homem. Naquele momento o homem declarou: “eu creio, Senhor! E o adorou.” (v.38). A conversão se completa aqui. Jesus não apenas curou sua cegueira, Ele trouxe salvação e vida. Ajoelhar e adorar era apenas algo feito para Deus, ao fazer isso diante de um homem, o cego deveria crer que aquele homem era Deus, filho do próprio Deus. Depois de ser curado o entendimento do homem sobre quem Jesus é vai aumentando: homem – profeta – de Deus – DEUS. Já os fariseus são culpados, pois se não soubessem quem Jesus era não teriam culpa alguma por rejeitá-lo, mas sabendo e rejeitando se tornam culpados e cegos.
Não se trata apenas de criar ou restaurar corneas, retina e visão, trata-se de conceder vida. De abrir os olhos da nossa alma para contemplar O Criador. Trata-se de se render a graça salvífica de Cristo – morto na cruz pelos nossos pecados. O mundo está em treva como o homem cego de nascença. Mas Jesus é a luz do mundo e traz visão e conhecimento. A luz de Cristo sempre vai nos guiar, não precisamos nos levar pelo desespero, temor aos homens ou discussões vãs sobre doutrinas. Lembre-se que o cego chegou a fé completa através de etapas. Ele enxergou em um instante, mas o entendimento sobre Jesus foi um processo!
Maravilhosa graça, quão doce é o som que salvou um miserável como eu. Eu estive perdido, mas fui achado. Eu era cego, mas agora eu vejo.
JG